Ontem, no Diário de Notícias, saiu este fantástico texto de Ferreira
Fernandes, o qual passo a transcrever:
“Haverá quem pense que isto é uma questão de caca. E é: depois da moeda
única, a União Europeia quer padronizar o autoclismo. Várias línguas, mas uma
só descarga na sanita. A Europa - quando se prova o inverso por todo o lado -
quer convencer-nos de que de cócoras somos todos iguais.
Uma comissão reuniu-se durante três anos e produziu um relatório de 122
páginas (e não, não foi entregue em rolo de folhas finas, os burocratas não
sabem ir diretos ao assunto). As conclusões foram: as descargas devem ser só de
cinco litros, com a alternativa de meias descargas de três litros. Enfim, a
receita do costume, cortar (hoje, os autoclismos comuns levam seis litros).
Se bem se lembram, o nome do sistema que nos levou à moeda comum era ECU
(do inglês European Currency Unit),
mas ECU estava mais adequado para esta nova medida da sanita única. Mobiliário
muito ligado à cultura - O Pensador, de Rodin, parece sentado numa sanita e é,
aliás, nessa posição que meia Europa leu poesia e jornais - a loiça sanitária
vai sofrer uma descarga única, tão própria destes tempos cinzentos. Olha, era
uma bela ideia para a Joana Vasconcelos (não é desdouro para ninguém, Marcel
Duchamp também esculpiu um urinol). Para retratar os tempos modernos, ela devia
fazer (não em mármore, como Rodin, mas em loiça, não sentado, mas de pé, e
sempre pensador) um homem carregando no botão do autoclismo, e a olhar o fluxo
fraquito de água. Hoje, até o que vai pelo cano abaixo é medíocre”.
Sem comentários:
Enviar um comentário